MULHERES, ESSAS TOLINHAS

Texto: Gabriela Souza Gomes

Se ele disser que acha que vai aparecer hoje à noite, pronto: é fatal. Ela tem certeza de que ele vai sim, aparecer. É evidente, ele só não quis dizer com todinhas as letras.

Precisando estar totalmente disponível para aquele encontro que certamente será o acontecimento da semana, ela precisa desmarcar tudo que havia programado. Liga para amiga e sente muito em cancelar o cineminha com pipoca e chocolate. Pura mentira, não sente é nada, mesmo que a amiga fique fula da vida, ela sabe que não vai deixar de ser amiga se o cineminha ficar pra outra hora. Agora aquele cara maravilhoso, não pode ser dispensado dessa forma, vá que outra tome a frente da fila e assuma o lugar que era pra ser seu. Convenhamos, seria quase uma tragédia. Definitivamente, não dá pra perder uma oportunidade dessas, ao menos não em sã consciência. Ninguém mais poderoso do que um homem para alterar a agenda de uma mulher.

Planos mudados. Agora é preciso decidir o ambiente. Uma jantinha com um ótimo vinho e boa música, ou quem sabe uns petiscos e ceva gelada. Talvez nem um, nem outro, o negócio é apostar num dvd, algum show bacana e decidir o rumo das coisas quando enfim, ele chegar. Mas de que estilo será que ele gosta? Na dúvida, pegue três na locadora, completamente diferentes, mas nenhum com gosto duvidável pra não atrapalhar a digestão.

Até aí tudo ótimo. Mas caramba! E a depilação, tá em dia? Se não, é preciso urgentemente resolver esse problema ultracabeludo. Caso não consiga uma horinha pela tarde, vai no giletásso mesmo. Nada que um bom hidratante não vá resolver depois.

Chega o momento de decidir o que vestir. Um jeans e uma blusinha básica. Melhor não - simples demais. Um vestido, com um decote sugestivo. Também não - ele pode achar vulgar. Quem sabe, deixa a porta entreaberta e espera ele com aquela lingerie novinha e linda, deitada como quem não quer nada no sofá e vendo ele chegar soltar um despretensioso “como foi que você entrou?”. Não, isso não. Se ele não achá-la depravada, vai pensar que a idade tá pesando e que ela mal lembra das coisas que faz, como por exemplo, esquecer a porta entreaberta. Que descuido! Melhor ficar com aquele jeans, é mais seguro. E bem, bem mais jovem.

Faltando tempo suficiente para continuar fazendo as coisas com toda a calma, é preciso dar uma organizada nos Cd’s, alinhar aquele quadro torto do hall de entrada, verificar se há toalha no lavabo, acomodar as almofadas. E importantíssimo: ver se os lençóis estão perfumados. Se bem que pode ser que ele julgue a cama como um local feito, única e exclusivamente, pra dormir. De qualquer forma, melhor não criar expectativas.

Um tempo depois, é hora de mergulhar em um banho digno de princesa, com direito a mimos, afinal, nada mais merecido. Um óleozinho perfumado pra deixar a pele macia para o caso de ele esbarrar no braço dela ou finalmente não conseguir se segurar e percorrê-la de norte a sul. Em seguida, há ainda todo o processo de secar o cabelo, escolher uma lingerie que lhe deixa gostosinha, vestir o jeans que desliza como seda na pele lisinha. Um corretivo pra disfarçar o cansaço, um rímel de leve pra destacar o olhar. Ah o olhar! Os olhos que não saem do relógio. E ele já deveria ter chego.

Senta no sofá, põe um dos dvds que alugou, tenta relaxar e dar uma descontraída. Pensa em mandar uma mensagem pro celular dele. Melhor não, ele pode achar que tá ansiosa. Volta a assistir o dvd, e dá uma olhadinha para o relógio e para o dvd e para o relógio e o relógio e o relógio. Melhor ligar! Não, ele vai se sentir pressionado. Mas e se aconteceu alguma coisa? Liga sim. Faz um pacto consigo mesma, se ele não chegar em 5 minutos liga pra ter certeza de que ao menos ele está em ótimas condições de chegar até sua casa.

Cinco, dez, quinze, meia hora passam. Levanta a bunda do sofá e vai testar a campainha, pra ter certeza de estar funcionando direitinho. Tudo em ordem. Será que ele bateu na porta e ela não ouviu? Não pode ser!

Troca o dvd e já prepara a faixa exata pra quando ele bater na porta. É essa, é essa música, anima-se. Então toca o telefone, corre empolgada pra atender. Ele não vem. Isso mesmo, ele não vai aparecer. Encostada na parede, vai escorregando até o chão – maldita hora em que colocou as almofadas no sofá. Ele não chegará, simplesmente porque não combinaram nada. Ele disse que achava que iria aparecer e ela entendeu que ele iria aparecer. Não, não escutou errado, apenas pensou que ele não deu certeza pra não parecer rendido aos encantos dela. Mulheres... essas tolinhas!

Se os homens soubessem o caos que são capazes de gerar no dia de uma mulher, jamais diriam que acham que irão aparecer. Eles iriam mais era aparecer mesmo, no duro. Até porque mal sabem o que estão a perder.

E quanto a ela, foi correndo chorar na cama, ao menos os lençóis estavam novos e cheirosos. Bendita hora que resolveu desmarcar o cinema com a amiga, regado a quilos de pipoca e o tão necessário chocolate.

3 comentários:

  1. Anônimo19:37

    Ah, o universo feminino! Quase tão enorme quanto o universo de verdade! Gostei da sua visita ao Crônicas & Agudas e mais ainda de te ler aqui! Beijos

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  2. nossa, nem sei dizer quantos dos meus dias correram exatamente assim... adorei.

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  3. Anônimo12:39

    Adorei!(rsrsrs) Sou capaz de anular com ele digo que minha amiga esta doente e coisa e tal (hahahahaha)Sou tambem capaz de passar oleo pra ele não me segurar (hahahahhahahah)

    Tô adorando!

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